domingo, 28 de junho de 2009

Desinvertendo o invertido

Imagine que você nunca tivesse visto uma camiseta. Esse pedaço de tecido em um formato que se encaixa no corpo lhe seria uma novidade. Certo dia, uma pessoa resolve lhe apresentar essa façanha do mundo têxtil, mas com um pequeno erro: ela traz a camiseta invertida. Você, que não entende do assunto, certamente concordaria que a etiqueta para fora, as costuras aparecendo, e a estampa para dentro são coisas normais, e não hesitaria em dizer que todas camisetas do mundo devem ser assim.


A literatura judaica nos conta a história do filho de um grande sábio que fez uma visita aos céus, mas voltou e continuou vivendo normalmente. O pai, surpreso com o que aconteceu, pergunta: "Filho, o que você viu?", e o mais recente terráqueo responde: "Pai, vi um mundo completamente invertido. Os que aqui estão por cima, lá estão por baixo; e os que aqui estão por baixo lá estão por cima". O pai lhe devolve: "Filho, você não viu nada invertido. Esse é o mundo claro. Nós que vivemos em mundo invertido".


Desde que nascemos, estamos acostumados com a realidade do nosso mundo - achando que ela é normal. O que mais vale é o físico ao invés do que ultrapassa os limites físicos. Grandes quantidades de dinheiro são mais desejadas do que um bom relacionamento entre as pessoas, chegando até o ponto onde uns passam o pé nos outros para atingir alvos mais "elevados" - mas que de elevados não tem nada. Uma boa comida, mesmo que faça mal à saúde, deixa de ser evitada simplesmente por causa de transmissões nervosas responsáveis por prazeres passageiros. Corpos são capazes de seduzir amigos, pais ou mães e destruir amizades ou toda uma estrutura familiar. Quando dizemos que o mundo aqui embaixo está invertido, não é simplesmente um clichê ou um modo de expressar indignação. Muitas pessoas se deixam levar pelas aparências ao invés de essências, pelo exterior ao invés do interior, trocando os valores que deveriam guiar suas vidas.


A Torá nos ensina o que na verdade é superior e o que é inferior, o que é relevante e o que é e irrelevante, além do mais importante: como trabalhar nossas características e assim nos acostumar à realidade. Nosso papel no mundo é desfazer essa inversão, seguindo os moldes que recebemos de geração em geração, e somente assim conseguir mostrar às pessoas o que realmente é relevante e "conta pontos". Quem sabe, assim, chegará o dia em que o mundo aqui embaixo será idêntico ao mundo lá em cima. Quem sabe, assim, chegará o dia em que as pessoas entenderão que as costuras das camisetas devem ficar para dentro.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Quem mente melhor?

Na parashá dessa semana Moshe manda os doze espiões verem como está a situação de Israel, a pedido de D'us. É famoso o pecado que eles cometeram: falaram mal da terra, e por isso o povo recebeu o castigo de ficar 40 anos no deserto. No entanto, uma coisa chama muito a atenção de quem lê o trecho. Eles começam falando que estiveram na "terra que jorra leite e mel". E isso não tem nada de errado, afinal de contas, essa é a promessa de D'us para nós até os dias de hoje, mesmo em tempos de crise econômica mundial.

Os espiões começaram todo seu pecado, a grande mentira, com uma grande verdade. Nosso sábios comentam, no local, que para uma mentira ter credibilidade ela deve ter sua parte de verdade. Contar uma história absurda e fora dos padrões da realidade é pedir para não acreditarem nela. O melhor mentiroso não é aquele que conta uma grande mentira - mas sim aquele que consegue aproximá-la da verdade.

O mesmo vale para as outras religiões. Se baseiam completamente em Torat Emet - a Torá da verdade - mas alteram detalhes essenciais, como a unidade divina. Fato que isso é bem aceito é comprovado pelo número de seguidores que existem pelo mundo inteiro. Afinal de contas, a parte verdadeira que elas possuem - a Torá que recebemos no Har Sinai - acaba atraindo muita gente. Mas não é por isso que elas sejam completamente verdadeiras - 99% de verdade é igual a 100% de mentira.

Relações interpessoais que não são preenchidas por transparência e verdade jamais podem durar para sempre. Como dito na Ética dos Pais, uma das bases do mundo é a verdade. Se queremos um mundo melhor, devemos adicionar em nossas vidas os ingredientes que proporcionam sua construção, e não sua destruição. Um dos ideais de um judeu deve ser se assemelhar a D'us. Devemos aprender com Suaas características. Assim como Ele criou o mundo, e é Verdadeiro, devemos ser verdadeiros e continuar Sua criação, sustentando o mundo com verdade.

(na mesma linha de raciocínio, leia nosso post Podar a Árvore)

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Cuidado no Alerta

Uma das coisas que mais incomoda quem deseja agir corretamente é observar alguém próximo fazendo um determinado erro constantemente. No entanto, muitos se questionam qual o direito que possuem de intervir na vida alheia, e não se sentem confortáveis em conversar com o amigo e adverti-lo. Aos olhos da Torá, qual seria a ação correta? Devemos nos sentir livres de avisar nossos amigos caso eles não estejam no caminho mais adequado, devido ao medo de não se intrometer na vida de alguém, ou será que somos obrigados a (pelo menos tentar) mudar a situação? Vire as páginas, vire as páginas, porque tudo está Nela - na Torá. No livro de Vaikra encontramos que há uma mitsvá de advertir o próximo: “Hocheach tochiach et amitecha” - não só temos o direito, como também o dever. Além disso, na Ética dos Pais está dito: "e adquira um amigo". Nossos sábios explicam que a importancia de se ter um amigo por perto se deve ao fato de um não se sentir atraído pelo ietser hara e assim conseguir enxergar melhor a essência do erro que o outro estaria prestes a cometer, alertando-o antes que fosse tarde.
Até ai, muitos sabem que devem advertir, mas não sabem como fazê-lo. Mesmo com a intenção boa, acabam agindo da maneira errada – e as conseqüências podem ser piores do que a indiferença.
D’us nos dá o mandamento de amar o próximo. Não é por acaso que isso aparece exatamente no versículo seguinte ao que nos ensina sobre a advertência. Daqui tiramos a primeira lição. Assim como D’us quer o bem de todas suas criaturas, porque Ele ama a cada um e um, nós devemos ser também. Deve ficar claro, tanto para quem fala quanto para quem ouve, que a força motora dessa conversa deve ser a mais pura possível: o amor. Todo o approach e a maneira de se passar a mensagem devem ser feitos o mais carinhosa possível.
Mas muitos ainda assim não se sentem bem, alegando que o certo é relativo. Perguntam a si mesmos: "desde quando somos os donos da verdade?". Desde que recebemos a Torá. Com ela, temos certeza do que é certo errado, aos olhos Daquele que criou o certo e o errado. Qualquer advertencia deve ser feita livre de interesses pessoais, com base no certo absoluto - e não relativo.
Por fim, mais uma lição: da nossa lashon hakodesh. É sabido que todas as palavras do hebraico possuem seus sentido ligado a sua raiz gramatical. O verbo advertir, lehochiach, também significa comprovar. Não podemos falar de advertencia sem lembrar que devemos mostrar para a pessoa o motivo dela estar errada. Advertir alguém por um erro que ela sequer não sabe ou não tem noção da gravidade é querer ensinar a atirar no escuro.
Que com se apoiando na base da Torá - o amor- possamos iluminar aqueles que estão a nossa volta, além de obviamente saber aceitar críticas construtivas da maneira adequada. Só assim poderemos ter um mundo mais correto, mais justo, e principalmente com o objetivo de toda a criação: o amor entre as pessoas.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Mais vale um na mão

Certamente você já se deparou em alguma situação em que gostaria de poder escolher, entre duas opções, as duas. Viagens, projetos, decisões, faculdade, e por aí vai.

No Talmud, dois grandes rabinos discutem sobre o dia da leitura da meguilá: isso deveria seguir duas conduções básicas. No entanto, em certo caso, devido a uma combinação de fatores, somente uma das regras poderia ser seguida. O que acontece no final é que cada um escolhe uma data, baseado em uma regra - e cada um decide algo diferente do outro. Quando um questiona o outro o porque da decisão, ambos dizem: não teve outro jeito de fazer! E sobre opiniões contrárias, nossos sábios dizem que ambas são verdadeiras, mesmo que opostas.

Às vezes, queremos abraçar o mundo todo. Escolher o máximo de coisas possíveis. Fazer o bem a muita gente. Mas nem sempre as condições permitem, nos forçando a abrir mão de alguma coisa. Escolhemos. Começam então as dúvidas e os questionamentos sobre como teria sido escolher o outro lado da bifurcação. É aí que devemos lembrar da frase de nossos sábios: ambos caminhos são bons, verdadeiros, e no fim das contas, qualquer um dos caminhos escolhido representa Sua vontade: o bem de cada um de nós.

Por isso, quem deseja pouco as vezes alcança mais do que quem deseja muito.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Helenização? Não, obrigado

Em um país como o Brasil, é interessante ver quanta gente diferente convive junto. No meio universitário, isso é reforçado pelo número considerável de alunos de pós-graduação que saem de seus países ou por alunos de intercâmbio. Ontem tive a oportunidade de conversar com uma professora, que me explicou o motivo de seu sobrenome um tanto diferente: seu pai é de origem grega. Até ai, tudo bem.
Papo vai, papo vem, ela conta que já esteve em Israel. Até ai, tudo bem. Afinal de contas, não são raros congressos mundiais em Israel (isso sem falar nas universidades de ponta que existem por lá). Quando perguntei quais cidades ela visitou, logo disse: Holon, Hevron, além das óbvias Jerusalém e Tel Aviv, entre outras. Origem grega?
Sim. O problema é que só seu pai. Sua mãe é judia, e portanto, ela também. Ao perguntar se ela sabia que era judia, ouvi um "já ouvi dizer por ai" bem despreocupado. Quantas pessoas, assim como ela, devem existir só aqui no Brasil, que são iehudim e não sabem? Quanto disperdício. Possuímos uma das mais antigas culturas do mundo, temos o copyright do livro mais vendido no mundo, e muitos por ai nem dão valor. Não consigo imaginar o número de iehudim que sabem e não dão valor, e muito menos imaginar outro número, maior ainda: o de iehudim que nem sabem de sua essência. Tanta dor não entra na minha cabeça.
O que sim está na minha cabeça é a resposta para isso: enquanto não estivermos todos em Erets Israel, e ("e", não ou) seguindo nossos princípios milenares, estaremos sujeitos a ver a próxima geração com sobrenomes um tanto diferentes.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Lag Baomer: mais de vinte séculos, lições atuais

Hoje é Lag Baomer, o trigésimo terceiro dia da contagem entre Pessach e shavuot. Foi no mesmo dia que hoje que pararam de morrer, há quase dois mil anos, os alunos de Rabi Akiva pela falta de respeito um com o outro. É hoje também o aniversário de morte de Rabi Shimon Bar Iochai (um dos 5 alunos que sobraram de Rabi Akiva após a peste). Ele foi o autor do livro base da tão comercialmente explorada kabalá, e quis que seu aniversário de morte fosse comemorado com muita alegria.

Um dos símbolos que representa este dia é o arco e flecha. A explicação para isso é que na época de Rabi Shimon Bar Iochai os judeus eram proibidos de estudar Toraá Como é impossível um judeu se desligar da Torá, eles A estudavam escondidos. Quando os guardas do imperador vinham ver o que estavam fazendo, sacavam cada um seu arco e flecha e fingiam estar treinando.
Mas o arco e flecha não nos passa somente a mensagem da resistência espiritual (e hoje em dia, da liberdade e da vitória do povo judeu sobre aqueles que tentaram destruí-lo). Ele transforma toda a energia potencial em movimento. Quanto mais pra trás a flecha vai, maior é a distância que ela alcança. Quanto mais esticada a corda, mais energia armazenada.

O mesmo vale para cada um de nós. Quanto mais afastada do judaísmo uma pessoa é, maior é seu mérito ao cumprir qualquer mandamento, e maior é sua recompensa. Nós vivemos distantes de Israel, no "fim do mundo à esquerda" do judaísmo, e convivemos com tantas outras culturas. Cada pequena mitzvá cumprida, justamente por ser mais difícil e suada, é muito mais considerada, e suas consequências, físicas ou não, conseguem chegar muito mais longe.
Dessa maneira, o arco e flecha também simboliza esperança. O judaísmo não vê o sofrimento/dificuldades de forma negativa: D'us faz tudo para o bem, com o objetivo de transformar a pessoa, buscando um crescimento pessoal (leia "Eu quero! Eu quero!"). Que quando 'nossas cordas estiverem esticadas', olhemos um pouco para o futuro, imaginando a flecha indo bem longe, e assim recebendo mesmo as dificuldades com amor a D'us.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Aficoman

Sem dúvida o Seder de Pessach é uma das maiores criações pedagógicas judaicas. Uma aula interativa que se vale de todos os recursos sensoriais e psicológicos para incutir o sentimento da redenção dos judeus do Egito nas novas gerações
Portanto existem no Seder vários pequenos detalhes que podem passar desapercebidos por um observador desatento. Um deles é o Iachatz.
Na frente do condutor do seder existe uma Keará (bandeja) sobre a qual, entre outras coisas, se encontram 3 matzot. Após comermos o Karpas (a batata ou o salsão mergulhado na água com sal), o condutor do seder agarra a Matzá central e a parte na metade, e esconde metade dela para o Aficoman (que é procurado pelas crianças no fim do Seder).
Esse costume enigmático representa mentalidade de escravos com a qual iniciamos o Seder. Ao vermos um pouco de comida na nossa frente, guardamos metade para amanhã. Quem pode ter certeza se amanhã teremos mais? Somos como refugiados de guerra que temem pelo futuro incerto.
Porém quando chegamos ao fim do Seder, após termos lido a Hagadá e jantado, passamos por uma transformação. Agora não somos mais escravos: somos homens livres. Agora não tememos pelo amanhã: nós confiamos plenamente que o mesmo D-us que nos tirou do Egito irá nos garantir a janta de amanhã.
Portanto, quando chegamos ao fim do Seder, mandamos as crianças buscarem o Aficoman, e o comemos sem pensar duas vezes. Aliás, de acordo com a Lei Judaica o Aficoman precisa ser comido antes da meia noite. É proibido manter a “cabeça de escravo” por tempo demais.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

[livros] - Desvendando o Homem

Foi lançado, essa semana, o livro Desevendando o Homem. O autor, Rabino Samy Pinto, explora o pensamento do Maharal de Praga sobre a educação. Entre outros assuntos abordados, é dada ênfase ao amor necessário à educação de cada indivíduo, antes de se pensar na educação de uma comunidade inteira.
No evento estavam presentes, entre líderes da comunidade, o educador e vereador mais votado das últimas eleições, Gabriel Chalita (vale a pena ler seus textos), e um professor da Universidade Bar Ilan (Israel). Rabino Samy Pinto possui bacharelado em Economia pela Faculdade de Ciências Econômicas do Rio de Janeiro, é especialista em educação pela Universidade Bar Ilan, e pH.D. em Letras Orientais pela USP.
O livro pode ser comprado na Livraria Sefer. Transcrevo aqui a contra-capa do livro, escrita por Gabriel Chalita.
"O livro do Rabino Samy Pinto é uma obra-prima, uma reflexão cuidadosa sobre a complexidade do sistema educacional e a sua relação com a essencialidade humana: a felicidade. A felicidade humana é a nossa maior vocação. Sua definição é simples e, paradoxalmente, complexa. Ser feliz é ter virtudes. É amar ao outro e a si próprio. A felicidade contempla o bem e nos faz ser bons. Ilumina com sabedoria e nos faz conviver, compartilhar a vida harmoniosamente com outros seres humanos. A sabedoria nos ensina a moderação e a compreensão. Moderamos os nossos apetites e compreendemos o outro, que não é o resultado de nossas projeções, mas é sujeito de sua própria história. Essa felicidade nos leva a viver em paz. Paz interior e paz social.
E é esse o nosso sonho. Transformar a nossa vida num serviço, superando vícios e construindo virtudes. A ética, caminho único para a felicidade, segundo Aristóteles, nos conduz por essas sendas. A riqueza do meio termo, do equilíbrio, do respeito na edificação de um mundo mais harmonioso.
E a educação é o melhor caminho para que a potência humana se concretize em ato. Tudo vem dos bons hábitos semeados durante a infância e a adolescência. Daí a importância crucial da educação como agente de transformação e elevação do ser humano. A reforma educativa judaica proposta pelo Rabino Maharal nasceu das inquietações desse filósofo da educação que, observador crítico do sistema educacional ashkenazita da época, ansiava por uma pedagogia transformadora, humanizadora e intelectualista. A educação sempre foi objeto de investigação de homens iluminados. São os entusiastas. Entusiastas como Maharal, entusiastas como Samy Pinto, que nos presenteia com este brilhante trabalho sobre a trajetória de um educador que preconizava que as "boas raízes jamais permitirão que árvores caiam e que seus frutos deixem de alimentar a sociedade". O Rabino Samy Pinto é a prova disso. Consegue unir densidade acadêmica, discurso e prática a serviço do outro, do seu encontro com a vocação primeira, ou seja, a felicidade plena."

domingo, 29 de março de 2009

Mais de 1000 dias no cativeiro


Semana passada e essa semana houve uma grande decepção em Israel. Todos acreditavam que o Guilad Shalit (sequestrado pelos terroristas palestinos há quase 3 anos) iria voltar para casa. As negociações com o Hamas (através de um intermediador egípcio, no Cairo) duraram várias semanas mas terminaram no nada. Os palestinos subiram as suas exigências até um ponto que Israel não estava disposto a pagar.

Passei por uma tempestade: entre a razão e a emoção. A dor e a tristeza que causam o cativeiro de um irmão é difícil de ser medida. Com certeza o Hamas não se preocupa em tratar do Guilad de acordo com as convenções internacionais, e só D-us sabe como eu ficaria feliz de vê-lo voltar para casa. Porém a minha razão fez festa.

A decisão de sentar para negociar com o Hamas foi errada desde a raiz, assim como também foi a negociação que fizemos com o Hezbolá há alguns meses (quando recebemos os cadáveres dos dois soldados que perdemos no início da guerra do Líbano: Ehud Goldwasser e Eldad Reguev). Qualquer negociação om grupos terroristas tem consequências desastrosas.

A Mishná define uma regra clara. Apesar de que resgatar judeus cativos nas mãos de goim é a mitzvá mais importante da Torá, existe uma proibição de resgatá-los por um preço maior do que o seu valor de mercado (a Mishná se refere a uma época na qual cativos de guerra eram vendidos como escravos). O motivo: Tikun Haolam (o conserto do mundo).

A Mishná vem nos ensinar que apesar da dor que existe no cativeiro de um judeu somos proibidos de permitir que ela cale a nossa razão. Caso paguemos preços extorsivos e provemos que o sequestro de judeus é lucrativo e rentável, viramos vítimas de extorsões. Caso cedamos às exigências do Hamas, teremos uma epidemia de sequestros de soldados. Baseando-se nisso, muitos defendem que é necessário manter o princípio da proporcionalidade. Um soldado por um prisioneiro (e não 1 por 400 conforme os Hamas exige) e vivos por vivos (e não prisioneiros vivos por cadáveres igual fizemos com o Hezbolá no ano passado).

Porém acredito que nas circunstâncias atuais é proibido até mesmo uma negociação proporcional. Porque não se trata de uma comunidade judaica no meio da diáspora que não tem opção fora a pagar o resgate (que é o caso descrito pela Mishná). Aqui se trata de um país que dispõe de uma infinidade de meios de lidar com os palestinos. Nesse caso responder proporcionalmente é ceder a chantagem.

Israel não pode sentar para negociar com uma organização que lhe nega o direio de existência. Isso não é proporcional; não é simétrico. Israel pode cortar o suprimento de petróleo, eletricidade, bens humanitários, e água para pressionar o Hamas. Israel pode prender toda a cúpula do Hamas igual já fez em algumas ocasiões e trocá-la pelo Guilad. Israel não pode permitir ser pressionado; Israel deve pressionar. Por isso critico a açào da mídia e de todos aqueles que organizaram passeatas e manifestações pressionando o governo israelense a ceder nas negociações com o Hamas. Eu também quero o Guilad de volta, mas o slogan que foi bramido em Israel “a qualquer custo” é criancice.

Aliás, deixando todas as considerações de chantagens políticas de lado, a mais simples aritmética condena a liberação de terroristas. Já foram mortos mais de 1500 judeus por prisioneiros árabes que foram libertados por Israel devido a negociações ou como demonstração de boa vontade. Atualmente os jornais focam a família do Guilad e a sua dor. Só que eles não focam a dor de 1500 famílias que perderam os filhos devido a esse tipo de acordo. Queira D-us iluminar os nossos líderes para que não cedam a pressões (internas e externas) e tragam os cativos de volta para que possamos cantar com eles no seder de Pessach “avadim hainu... ata bnei chorin” - fomos escravos... agora, homens livres.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Just do it

Ninguém gosta de ouvir promessas que não se cumprem. Certamente você já reencontrou com aquele amigo de infância e depois dos caloroso cumprimentos e de se lembrar de velhas histórias, combinaram de sair. No final, deve ter escutado um "vamos sair, mesmo!" ou um "pode deixar que eu te ligo!". Passa o tempo, vocês se encontram novamente em alguma festa e se lembram que o combinado não saiu de suas mentes...
Já estávamos 4 shabatot falando sobre a construcao do mishkan. Nas parashiot anteriores, D'us passa para Moshe todos os detalhes da magnífica obra. Na parasha de pekudê, lemos que Moshe e Am Israel fizeram de acordo com o ordenado por D'us. No entanto, ao invés de economizar parágrafos e capítulos, falando simplesmente "e Moshe fez de acordo com o ordenado", todos os detalhes são repetidos: roupas dos cohanim, cortinas, paredes, os ganchos para estender sobre as cortinas, e os utensílios, entre outras coisas. Tim tim por tim tim, novamente.
Se planejar algo e colocar em prática fosse a mesma coisa, não haveria necessidade de repetir cada vírgula da construção do mishkan. Isso vem nos mostrar que, pelo judaísmo, a teoria e a prática são coisas completamente distintas. Apesar de serem extremamente ligados e dependentes, o momento do planejamento teórico é um, e o da execução é outro. Cada um tem seu valor independente, e por isso, no judaísmo, mesmo que não se entenda algum conceito ou alguma mitsvá perfeitamente, ganhamos sua recompensa somente por realizá-la. É sabido também que todo o objetivo final de estudar Torá é trazê-la ao mundo físico, e transormá-lo, através de mudanças e ações, seja no relacionamento com si mesmo, com os outros ou com D'us.
Aqueles que fazem mais do que falam estão no caminho certo. Como dito em Pirkei Avót (Ética dos Pais), "Emor meat, vaasse harbe" - fale pouco e faça muito.

terça-feira, 24 de março de 2009

Livros ambulantes

Me canso de algumas coisas no meio acadêmico. Apesar de ter contato com professores super simpáticos, não aguento mais ver aqueles pH.D's que sabem muito sobre suas áreas de pesquisa, mas sequer sabem se relacionar com seus alunos. Publicam vários artigos por ano, mas não sabem agradecer os faxineiros que possibilitam a limpeza em seus laboratórios; dão palestras em mega congressos, mas se esquecem que cada um que está lá o admira; trabalham com genes, proteínas, números e exames, mas esquecem que tratam de pacientes.
Na última semana, lemos sobre a construção do mishkan. D'us ordena a Moshe que aqueles que deveriam construí-lo fossem chacham lev - inteligentes do coração. A princípio, muito contraditório. A inteligência é representada pelo cérebro, enquanto que o coração representa os sentimentos. Aparentemente, uma coisa nada tem a ver com a outra, já que para transformar a materia prima no produto final, para construir algo físico, somente o conhecimento técnico é necessário.
No entanto, a própria história do nosso povo nos mostra que o conhecimento não é somente uma coleção de ideias e conteúdo. Como realizadores do holocausto, engenheiros civis construíram câmaras de gás e crematórios, químicos desenvolveram o gás zyklon B, conhecedores de conceitos médicos (que jamais podem ser considerados médicos) faziam experimentos (?!) com seres humanos. Eu poderia dizer que todo o conhecimento que eles possuíam foi jogado fora, desperdiçado, mas isso seria um erro. Pior do que desperdiçar um recurso é utilizá-lo para um fim indevido.Até o momento em que alguém inteligente a utiliza para fazer o bem, de nada vale seu conhecimento. Afinal de contas, no campo prático, o inteligente que não faz o certo e o bobo que também não faz o certo, estão na mesma. Um burro de carga que carrega uma pilha de livros em suas costas continua sendo um burro de carga.
Cada chacham lev foi escolhido porque sabia conciliar seu conhecimento ao comportamento e às relações humanas. D'us não queria de forma alguma que sua morada fosse construída por pessoas que, por mais que fossem geniais e fizessem o trabalho da melhor maneira possível, não soubessem se relacionar uns com os outros. Devemos aprender com eles e proceder da mesma maneira. Devemos fazer com que a distância de 20 cm entre o coração e o cérebro se torne menor ainda.

segunda-feira, 16 de março de 2009

A grande mistura

Para uma pessoa religiosa, eu diria que eu sou uma pessoa que mantém bastante contato e troca ideias com pessoas não tão próximas do judaísmo. Vira e mexe, escuto um forte questionamento: por que há tanta divisão entre os religiosos, e mais ainda, entre eles e o não religiosos? Será que isso é certo?
A parashá que lemos anteontem conta alguns detalhes do mishkan, entre eles o ktoret (incenso) que era queimado todo dia. No total, 11 ervas compunham sua receita: dez delas com aromas agradáveis, e uma delas com um cheiro não tão gostoso. Não seria estranho, num lugar de tanta beleza (como comentamos aqui), no lugar onde a schiná (presença divina) estava presente (!), colocar uma essência assim?
Nossos sábios comentam no Talmud que isso era um exemplo perfeito de como deveria ser o comportamento do povo. Mesmo com todas as diferenças entre pessoas com estilos de vida variados (e até opostos), todas devem estar juntas, com o mesmo objetivo: assim como os ingredientes do ktoret estavam. E nem por isso a essência excêntrica era deixada de lado. Hoje em dia, vale o mesmo. Pessoas não tão próximas da Torá, religiosos, pessoas que pensam diferente, desconfiados, pessoas com dúvidas e questionamentos: todos devem estar juntos e lembrar que pertencem à mesma raiz.
No entanto, não digo que esse contato deve ser feito de qualquer jeito: a identidade judaica estar firme o suficiente (e aí por sua conta e risco) para uma interação saudável. Conheço pessoas que saíram de repente da "bolha" e acabaram se perdendo. Mas se você vir uma pessoa que se diz religiosa e possui um tratamento pejorativo com aqueles que não se dizem religiosos, questione seu comportamento se baseando no ktoret, e veja se ele possui uma resposta válida.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Direção certa

Como diria a estrela do samba rock, Seu Jorge, "está na luta, no corre corre, no dia-a-dia". De fato, a rotina puxada às vezes nos garante somente poucos momentos livres - e fica difícil não querer descansar nesses intervalos. Por isso uma leve diminuição na frequência com que os posts são colocados, e mais do que isso, as ideias da semana passada ficaram para depois - e o depois é agora.
A parashá da semana passada, terumá, gastou boa parte de seu conteúdo explicando as roupas que o Cohen HaGadol usava. Sua proximidade com o trecho que explica alguns korbanot (sacrifícios) faz nosso sábios concluírem que, da mesma maneira que os korbanot limpavam alguns pecados de Am Israel, assim também as roupas especiais o faziam: o ktonet (um tipo de avental) "limpava" eventuais assassinatos, o michnassaim (um tipo de calça capri) garantia o perdão por relações proibidas, os acessórios usados na cabeça perdoavam aqueles que eram metidos e arrogantes (com o ego lá em cima, assim como a cabeça está lá em cima), e o meil (uma roupa azul - tchelet) trazia perdão por fofocas & cia. - a famosa Lashon Hará.

Um motivo simples para o meil trazer kapara por Lashon Hará é que ele possuía vários sinos ao seu redor. Lashon Hará é feita com o som mais comum: a voz. Os sinos, por também produzirem sons, sons sagrados ao invés de profanos (como das fofocas), nos ensinam em que sentido devemos utilizar nossos dons.

Um motivo mais filosófico é trazido pelo Maharal de Praga. A cor azul do meil é a mesma do tsitsit: ao olhar para essa cor, lembramos do mar, ao lembrar do mar nos recordamos do céu, e o céu nos lembra D'us. Não é simples: algumas etapas necessárias para chegar em um objetivo final, através da nossa imaginação. Com a Lashon Hará é a mesma coisa, porém puxando para o lado ruim: muitas vezes nos deparamos com situações, e ao julgar para o lado ruim, já imaginamos coisas. Coisas que, em muitos casos, não aconteceram em nenhum lugar fora das nossas cabeças. Mais uma vez, o meil nos ensina que todos os dons, características, e super poderes que cada um de nós tem, deve ser utilizado com o intuito de nos tornarmos pessoas cada vez mais bondosas, mais produtivas, ao invés de utilizá-las para trazer mais escuridão à nossa volta.

terça-feira, 10 de março de 2009

A consciência judaica

O exílio físico e espiritual do povo judeu tem dois grandes marcos: um no seu início (após a destruição do primeiro Beit HaMikdash) e um no seu final (antes da declaração da independência de Israel). O primeiro desses marcos foi Purim, quando foi frustrada por completo a tentativa de aniquilar o povo judeu. O segundo foi a Shoá, quando infelizmente, essa tentativa foi frustrada mais tarde do que devia.

O denominador comum entre os dois eventos foi o fato de um império de dimensões mundiais (o império Persa se alastrava desde as portas da Índia até o Egito, e a Alemanha nazista tinha pretensões não muito menores), sob cujo domínio vivia boa parte do povo judeu (no caso da Pérsia, literalmente todo o povo), declarar os judeus como inimigos nacionais passíveis de aniquilação.

De acordo com a Guemará, os judeus na época de Purim foram punidos (correndo risco de extermínio) porque participaram do banquete de Achashverosh. O rabino Shlomo Elkabatz (o autor do Lecha Dodi) escreveu o mais belo livro existente sobre a Meguilat Ester (o nome do livro é Matanot Levi). Nele ele explica que toda a comida da festa dada por Achashverosh era 100% Casher, e os judeus da época viram isso como uma autorização par tomarem parte nela. “Afinal de contas, se a comida é Casher qual é o problema?”

Essa observação feita pelo rav Elkabatz levanta uma pergunta pertubadora: então, pelo amor do bom D-us, qual foi o grando problema dos judeus terem participado da festa de Achasverosh? O problema é que o intuito dessa festa era divulgar a supremacia dos Persas sobre todas as outras nações conquistadas por eles, inclusive Israel. A Guemará descreve que Achashverosh fez questão de utilizar os utensílios do Beit HaMikdash na festa. Porém esse não era o motivo oficial da festa. Isso era apenas um ponto secundário na festa. Exatamente por isso os judeus se deram ao privilégio de ignorá-lo.

Essa é a maior paródia do judeu da Galut. A comida Casher é imprescindível, porém o desprezo pelo Templo pode ser ignorado. O, assim conhecido, judaísmo “do estômago para baixo” expressa a cabeça da Galut. Esse judeu pode se preocupar com todas as minúncias da Halachá, mas esquece do espírito que há por trás dela. Ele pode saciar a sua sede espiritual fechando-se em si mesmo e ignorando o que acontece ao seu redor. “O importante é que a comida do meu prato seja Casher”

Purim foi uma lição que nós precisávamos aprender no começo da Galut (infelizmente ainda não a assimilamos totalmente): judaísmo não é apenas religião. Não é possível ser um bom judeu ignorando o que acontece ao meu redor. Não nos é permitido fechar os olhos às afrontas que ocorrem ao nosso redor. Nós não podemos ignorar a nossa dimensão nacional.

Essa é parte do libelo de Haman e de Hitler: não importa o que o judeu faça ele sempre será um povo diferente dos outros, ainda que ele pise e sapateie sobre as sua mitzvot. Mesmo na Galut o judeu possui uma dimensão nacional e ai dele se esquecer disso. Ao entender isso o judeu fortalece as suas duas dimensões: tanto a religiosa como a nacional. Ele entende que é impossível dissociar a Torá do mundo real; externo. D-us escreve reto por linhas tortas, e sem dúvida parte da função da Galut é fortalecer a nossa identidade nacional.

Não somos uma nação como todas as outras. Graças a Torá nós somos capazes de sobrevivermos mesmo no exílio, longe da pátria. Porém não somos uma religião como todas as outras. Graças a Torá somos capazes de nos reunirmos ao fim do exílio de volta a nossa pátria.

terça-feira, 3 de março de 2009

Ninguém nos apaga

Como escrevemos aqui, a última quarta-feira foi rosh chodesh adar, e também fez um ano (pelo calendário hebraico) do atentado a yeshivá de Merkaz Harav.
A data foi lembrada, na mesma yeshivá, de forma muito bonita e de um ponto de vista . Ao invés de expressar ódio e outros sentimentos de vingança, a última quarta foi marcada por muito amor: oito novos sifrei Torá foram doados, cada um em memória a um estudante assassinado. Amor pela Torá, amor por Am Israel, amor por Eretz Israel. Foi demonstrado, mais uma vez, que a fonte inesgotável de sabedoria e alegria do povo judeu nunca poderá ser apagada da face da terra. Podem tentar nos apagar quantas vezes quiserem - mas escreveremos a nossa essência quantas vezes for necessário.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Limitar o Ilimitado?

Há duas semanas líamos sobre a entrega da Torá. Um evento único na história, que chama a atenção por ter sido algo imponente: milhões de pessoas, milagres expostos. Se tentarmos definir ou conceituar essa Revelação Divina, podemos nos satisfazer com uma palavra: expansão. D'us mostrou para todos que é Único, e expressou isso também com palavras, através dos dois primeiros mandamentos. Ele é Único, e em todos os 510 milhões de km² da Terra e no resto do universo, não existe mais nenhuma divindade.

Pois bem. Essa semana lemos sobre algo inédito (como comentamos antes aqui): D'us ordena que Moshe construa o Mishkan - um templo no melhor estilo "faça você mesmo": flexível e que podia ser montado quando necessário. Além de inédito, isso até soa um pouco contraditório com o Maamad Har Sinai (entrega da Torá). Agora o D'us ilimitado quer que a gente O encontre em um lugar limitado? O D'us infinito quer se "encaixar" em um local de 50x25m? O D'us atemporal quer que a gente tenha contato com Ele em tempos determinados?

Vamos tentar fazer um paralelo, guardadas as devidas proporções. Para eu saber quem é Michael Phelps, não preciso comer 12.000 Kcal todo dia, não preciso treinar horas/quilômetros em uma piscina, e não preciso fazer musculação todo dia (nem tomar dopping?). Não preciso viver a vida do melhor nadador do mundo. Basta ligar a TV numa final olímpica, ver que ele faz 100 metros em 47 segundos, e que ele ganhou oito medalhas de ouro em Pequim. Tudo dentro do que sou capaz de fazer.

Voltando ao nosso assunto, por mais que pareça um paradoxo, essa também é a realidade da Torá. Ela quer que a gente capte Sua presença dentro das nossas possibilidades. Do mesmo jeito que somos limitados por nosso corpo, estamos presos por nossos sentidos. Bastava entrar no Mishkan para ver aquela obra arquitetônica, aquelas lindas peças banhadas a ouro e cobre, sentir o aroma do ktoret (incenso), e assim, em um espaço limitado, se conectar ao D'us infinito. Hoje em dia não muda muita coisa. Ele não quer que façamos nada de outro mundo - basta usar nossos sentidos para perceber a presença Divina nos menores detalhes que regem o mundo.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Paisagens


O ser humano é suscetível a influências do ambiente no qual ele se encontra. Consciente ou inconscientemente o nosso estado de espírito depende do cenário no qual nos encontramos. As pessoas podem responder a esses estímulos de muitas formas, mas o sentimento provocado por um dia nublado, cinza, não pode ser o mesmo que é provocado por um dia com o céu azul. De acordo com o judaísmo, a visão do céu recorda a alma a visão do trono celestial de D'us. O céu descoberto, sem núvens, é um convite para ligar-se ao infinito.
Um componente importante desses fatores aos quais somos suscetíveis é a paisagem. Quando estamos no pico de uma montanha há a sensação de ter o mundo nas nossas mãos, uma sensação de liberdade. Por outro lado, quando estamos no fundo de um vale, com o horizonte bem alto, experimetamos um sentimento de introspecção. (Aliás esse contraste entre montanhas e vales é muito perceptível em Ierushalaim, e possui uma influência interessante sobre quem lá vive).
Mas há uma paisagem peculiar do Brasil que ainda não conhecia em Israel: a serra frente ao mar. Ter o mar a sua direita e uma parede verde a sua esquerda. É difícil descrever os meandros da alma humana, mas de alguma forma eu sentia saudades dessa paisagem (ou pelo menos eu descobri que sentia saudades dela). Porém é óbvio que D'us não iria negar um presente desse à Sua terrinha. Semana passada descobri que é possível descer e subir o Carmel de bicicleta desde o Technion (há uns 300 metros acima do nível do mar) até a praia de Cheifá. E o meu suor foi bem recompensado: eu encontrei a minha paisagem. Um dos “dedos” do Carmel (que é uma cadeia de montanhas que se estende no Galil ocidental, no norte de Israel) chega bem próximo ao Mediterrâneo. E lá me vi eu, com o mar a minha esquerda e a montanha verde à minha esquerda. Há uma tradição de que nesse trecho da montanha fica a caverna na qual o profeta Eliahu presenciou uma revelação de D'us. Hoje em dia um teleférico leva desde a praia até o topo da montanha (mas não dá pra colocar a bicicleta dentro dele).
Enfim, matei uma saudade que eu não sabia que existia. Aliás, acho que essa é parte da beleza de Eretz Israel: a diversidade geográfica desse canto do mundo não deixa nada a dever pra ninguém: num raio de 400 quilômetros é possível ir esquiar nas montanhas do Golan, montar a camelo no deserto do Neguev, flutuar no ponto mais baixo do mundo e ver os vinhedos nas encostas das montanhas de Iehudá. É como se aqui existisse um concentrado de todas as paisagens do mundo. Afinal de contas se cada paisagem está ligada com um sentimento, essa terra precisa ser rica o suficiente para preencher o coração de idealistas e sonhadores do mundo inteiro.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Cada coração é precioso


Demorou, mas aqui estamos novamente. Enquanto o povo tupiniquim sai da ressaca do carnaval, nós iehudim só estamos agora entrando no mês da alegria. Ontem foi Rosh Chodesh Adar, o primeiro dia de do mês em que é comemorado Purim. Como diriam nossos sábios, "quando começa Adar, aumenta-se a alegria".

Na parashá dessa semana, terumá, estão alguns detalhes técnicos do Mishkan, e também o mandamento de construí-lo: "Veassu li mikdash, veshachanti betocham" - "E vocês vão me fazer um santuário, e Eu morarei neles". Quem bate de relance na frase, acha que Moshé Rabenu cometeu um gravíssimo erro de concordância - um mikdash: morar nele e não neles.

Nossos sábios explicam que isso não foi nenhum erro gramatical, e mas foi um "erro" intencional. Essa contradição pode facilmente ser explicada. O mandamento de construir um santuário é valido para cada iehudi, e não somente naqueles velhos tempos. Isso se aplica em cada dia do século XXI: devemos trabalhar para lapidar individualmente o nosso próprio "santuário". Nossos corações devem ser aperfeiçoados a cada dia, devemos melhorar nossas midot (traços de caráter), devemos estudar Sua Torá e fazer o bem. Esse trabalho, em cada caso particular, pode ser até mais difícil do que construir aquele antigo e enorme templo físico. Somente assim, com muito esforço e dedicação constantes, a promessa é cumprida: Hashem poderá morar nos nossos corações.

Partindo da parashá da semana, chegamos no assunto da semana - e nada é por acaso. No Rosh Chodesh Adar do ano passado aconteceu uma grande tragédia para Am Israel: um terrorista palestino (com cidadania israelense!) assassinou oito adolescentes que estudavam na famosa yeshivá de Merkaz Harav. Esses oito jovens valiam, cada um, tanto quanto um Mikdash vale para nosso povo. Após um ano desse trágico acontecimento, nos aproximamos mais uma vez da festa de Purim. Esperamos que, do mesmo jeito em que (com muito esforço e crescimento não físico) a tristeza dos tempos de Mordechai foi transformada em alegria, possamos superar a dor e atingir a verdadeira felicidade do mês de Adar.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Nada adianta contra a Propaganda

Durante o último conflito que ocorreu na faixa de Gaza, publicamos aqui um texto de João Pereira Coutinho, colunista da Veja. Agora á vez de Reinaldo Azevedo, colunista da mesma revista. Coloco aqui outro texto, que foi publicado na Veja da semana passada. 

"A notícia não está em nenhum dos jornais brasileiros ou nos grandes sites noticiosos. Lembram-se aquele ataque das Forças de Defesa de Israel a uma escola da ONU, que matou 43 pessoas? Pois é. Não foi numa escola da ONU coisa nenhuma, o que os israelenses vinham dizendo desde o dia 6 de janeiro. Só na segunda-feira, quase um mês depois, Mawell Gaylord, coordenador de ações humanitárias da ONU em Jerusalém, admite a verdade: o morteiro foi lançado numa rua PERTO da escola, mas não contra a escola.

Ora, recuperem o noticiário dos jornais e sites do Brasil e do mundo naquele dia 6. Lembro-me de ter aqui ironizado que os israelenses, maus como pica-paus, não podiam ver uma escola da ONU que iam logo jogando morteiros. Talvez para se livrar do tédio, não é? Ah, acusaram-me de insensível facinoroso. Marcelo Coelho, da Folha, sugeriu no jornal e no seu blog que tenho certa simpatia pelo assassinato em massa de crianças... Mais: como eu alertasse aqui para o óbvio — O HAMAS É A FONTE DAS NOTÍCIAS —, fui acusado de realismo estúpido. Coelho chegou a indagar algo como: “Para que jornalismo se já existem os militares?” Ou coisa assim. Chegou a minha vez de indagar: PARA QUE COELHO SE JÁ EXISTE O HAMAS?

O jornalismo dele, não sei para que serve. O meu existe, entre outras razões, para que os freqüentadores deste blog possam ler com mais acuidade o que é noticiado na imprensa.

Não se espante, leitor, se, naquele episódio, não tiverem morrido as 43 pessoas anunciadas. Todas, rigorosamente todas as ditas “atrocidades” cometidas por Israel têm origem no, como direi?, Departamento de Propaganda do Hamas: do grande número de crianças e civis mortos ao uso de bombas de fragmentação e fósforo branco para atacar pessoas. Este segundo caso, então, pode dar pano para manga. A tal substância não é considerada arma química. É empregada para iluminar alvos noturnos e criar cortina de fumaça para ação da infantaria. Israel nega que tenha feito qualquer coisa fora das leis internacionais. Como negava que tivesse jogado morteiro numa escola da ONU — e falava a verdade. De todo modo, abriu-se uma investigação.

Como se vê, o Hamas faz direitinho o seu trabalho. O ataque mentiroso à escola foi manchete do mundo inteiro. O desmentido, até agora, está apenas no Haaretz. O mundo também não se interessou em manchetar as torturas e execuções sumárias que se seguiram à retirada de Israel de Gaza.

A imprensa ocidental se deixou seqüestrar pela lógica terrorista. Esse caso da escola merece a justa designação: ESCÂNDALO. Quer dizer que os homens da ONU em Gaza demoraram um mês para fazer o que poderiam ter sido feito em cinco minutos? Escrevi aqui, certa feita, que o principal inimigo de Israel no Oriente Médio é a organização. Foi uma gritaria. Eis aí.

Bem, esperar o quê? O principal representante das Nações Unidas em Gaza é um sujeito que acredita que os próprios EUA tramaram o 11 de Setembro...

Pois é, leitores. Como diria aquele, quando já temos o terrorismo e a ONU, pra que certo jornalismo, não é mesmo?"

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Eu quero! Eu quero!

Durante mais de dois meses estive esperando por duas coisas: o conserto de um computador e a aprovação de um projeto de pesquisa científica. Cada dia que passava, eu entrava em contato com as entidades responsáveis. Não aguentava mais as situações de 'em análise', 'aguardando confirmação', entre outras sequelas burocráticas. Finalmente, em um intervalo de menos de 4 horas, o que eu tanto esperava realmente aconteceu: tanto o suado e longo projeto foi aprovado, quanto o PC - tão Pessoal quanto Computador - funcionava novamente.

Extrapolando um pouco e brincando com comparações, uma criança pede um presente para o pai. Recebe um não. Esperneia, recebe mais um não. E isso continua ocorrendo até o momento em que a criança cresce em algum aspecto - e o pai percebe que seu filho já merece o que tanto desejava. Como resultado, o filho vai dar muito mais valor do que se tivesse ganhado o presente de graça, sem nenhum esforço, sem nenhuma espera.

Todo dia, toda hora, a todo momento, queremos receber o que tanto desejamos. D'us, por Sua extrema bondade - Sua essência - deseja nos dar tudo do bom e do melhor. Por que então não ganhamos? Porque nem sempre estamos prontos para receber: para um fluxo constante de água enxer o copo, o mesmo não pode estar furado - e de nada adianta colocá-lo embaixo até de uma cachoeira. Após o crescimento pessoal, após a mudança de características (midot), consertamos certos defeitos, e assim merecedores de um prêmio - e não de um presente, que vem de graça. O prêmio adquire outro valor, e é muito mais gostoso. Aí é so comemorar.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Quem viu?

É nas últimas duas semanas que se encontra, nas parashiot, uma das fortes provas racionais da emuná - a fé judaica. Ao contrário do que muitos pensam, o judaísmo não é uma fé cega, que simplesmente acredita em milagres vistos por poucos. Antes de acreditar, estudamos muito; nossa fé, antes de chegar no coração, passa pelo cérebro (e já passou por milhares de gênios do mundo da Torá ao longos dos milênios).
Pare para imaginar no que foi a saída do Egito: todos viram o mar se abrindo, e enquanto passavam pela terceira margem (a de baixo) seca, apontavam com seus dedos "Ze Eli veanvehu" - 'Este é meus D'us". Não foi uma pessoa que teve um sonho, não foi um grupo de dez pessoas, mas sim milhões de homens, mulheres, e crianças. Lemos nesse shabat a parte que narra a entrega da Torá. Mais uma vez, os mais de 3 milhões de pessoas viram a revelação Divina com seus próprios olhos, escutaram os trovões, escutaram os primeiros mandamentos da 'boca' de D'us. Algo como 30 estádios do maracanã. Suficiente, não?
Você pode mentir para muita gente durante muito tempo, mas é impossível mentir para todo mundo o tempo todo. É impossível enganar um povo inteiro, mais ainda por milênios. E nós estamos, ano após ano, vivos e comemorando a Pessach e Shavuot - as festas que representam essas duas situações: a abertura do mar e a entrega da Torá - assim como nossos antepassados comemoraram no primeiro ano após esses acontecimentos.
O judaísmo é e sempre será uma religião sem igual, única. Por que? Podemos fazer um blog só pra isso, mas uma boa resposta é que apresenta fatos históricos únicos, não encontrados em nenhuma outra das religiões (que, por acaso, saíram dela).

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Nigun Cracow

Coloco aqui um vídeo que conta a história sobre a origem de um nigun (música que não contém letra alguma, mas somente uma melodia). Em geral, os nigunim conseguem mexer muito com os sentimentos e emoções. O nigun em questão leva o nome da cidade onde foi criado, Cracóvia. A versão deste clipe é um pouco diferente dos nigunim tradicionais, que são em geral cantados (e não possuem solos de guitarra e viradas de bateria tão 'modernos'...).

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Mastros no Mar Vermelho

Para nós, yehudim, globalização não é uma novidade. Judeus de todos os cantos do mundo vivem em sincronia, através de um mesmo calendário e um mesmo estilo de vida. É exatamente essa característica que ajuda a absorção de um yehudi em qualquer canto do mundo: sempre é possível encontrar algo que relembre a nossa casa (as mesmas rezas, os mesmo livros, os mesmos costumes, e até mesmo as mesmas piadas).
Porém existem diferenças, especialmente em Israel. A vida judaica aqui adquire um caráter nacional, o que a enriquece muitíssimo. Shabat passado lemos na Torá o "Az iashir" - a canção que o povo judeu cantou após a abertura do mar Vermelho, comemorando e agradecendo a bravura de D'us. Entre outras coisas que lembramos nessa canção está o conhecimento de que D'us é Aquele que guerreia por nós. "HaShem ish milchama, HaShem shemo". "D'us é um homem de guerras, D'us é o seu nome". Na continuação da parashá também lemos sobre a primeira guerra (e consequentemente, a primeira vitória) propriamente dita do povo judeu: a guerra contra Amalek.
Aproveitando esse cenário de fundo, o rabinato chefe de Israel decretou que esse Shabat seria dedicado para agradecer a D'us pelos milagres que Ele realizou nessa última guerra, no mês passado, em Gaza. Passei o Shabat em Kriat Arba, ao lado de Chevron. Após a reza de Kabalat Shabat e Arvit, fomos jantar com a família, e depois, mais tarde voltamos a sinagoga para cantar algumas músicas (conhecidas pelos sefaradim como "Bakashot"). Após aquecermos as gargantas, preparamos os ouvidos para escutar as histórias de alguns soldados que estiveram em Gaza.
Não importa quantos milagres escutemos, sempre é chocante escutá-los de primeira mão. Um soldado comentou que em um dado momento, na primeira semana da guerra atiraram granadas contra o seu destacamento. Ele contou, que ele próprio foi pego de surpreso e não teve reação naquele instante. Porém as granadas não explodiram. Outro deles contou que o seu destacamento havia sido designado para invadir Gaza na primeira noite da guerra, porém por problemas técnicos a invasão foi adiada até a manhã seguinte. Conforme os soldados foram avançando no dia seguinte, puderam distinguir fios elétricos espalhados no meio do vinhedo por onde eles avançavam. Assim que se deram conta, começaram a recuar: explosivos. Quando haviam conseguido atingir uns 100 metros de distância, escutaram as cargas explodindo: 7 delas de vários lugares simultaneamente. Ele contou que vários soldados foram jogados ao ar devido a força da explosão (e muitos viram as armas escaparem de suas mãos), porém apenas dois se feriram levemente. Seria impossível distinguir os fios no meio da noite.
Outro soldado contou que o seu comandante, não religioso, chegou para o seu destacamento no primeiro dia da guerra com um pacote cheio de tzitziot: "Ninguém entra em Gaza sem vestir um tzitzit antes! Isso irá nos proteger!". De acordo com ele, inclusive dois soldados voluntários peruanos (que não eram judeus) também vestiram os tzitziot. No fim do segundo dia dos combates quando puderam descansar, puderam perceber que havia furos de balas nas suas armas (no "cat", a parte de trás do fuzil, que é apoiada no ombro, a alguns centímetros da carótida e da jugular).
Milagres atrás de milagres... A palavra para milagre em hebraico é "nes". "Nes" também significa mastro. Algo que pode ser visto à distância. Através dos milagres, D'us acena para todos que ele está ali atrás.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Mãos à obra!

É nessa semana que se conta sobre a saída do Egito e sobre a abertura do Iam Suf. Li um dos comentaristas falando que no momento em que o mar se abriu, todas as águas do mundo se dividiram em duas. Fiquei imaginando como seria beber um copo de água aqui no Brasil, como seria Michael Phelps terminando um revezamento em Pequim e a situação de desespero no Sea World, em Orlando, entre outras viagens.

Voltando à realidade, uma passagem merece destaque. Assim que soube que Am Israel ainda estava próximo, o Faraó resolveu voltar atrás de sua decisão, e pegar todo o povo e tudo o que tinham levado. Assim, Am Israel ficou encurralado e, no desespero, reclamaram ao seu líder Moshe. Mesmo sabendo que todos iriam se salvar (e que, para que isso acontecesse, teria que andar em direção ao mar), Moshe resolveu rezar para D'us. Como uma resposta diferente do que nosso líder esperava escutar, D'us lhe fala: "Você vai continuar pedindo para mim?"

É óbvio que tudo o que fazemos depende Dele. De acordo com a tradição, "hakol min hashamaim" - "tudo vêm dos céus". É indiscutível que devemos rezar muito pedindo que todos nossos planos e ações tenham sucesso. No entanto, a nossa parte deve ser feita. Em condições normais, se não houver um shaliach, um executor no plano físico, as coisas não se desenvolvem e o mundo não roda. Além de ficar somente pedindo, devemos lembrar que a vontade Dele é que nós sejamos Seus parceiros; que a gente também ponha a mão na massa e consiga atingir os objetivos, em todos os planos, na construção de uma vida melhor, e então de uma sociedade melhor e, por fim, de um mundo melhor.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Sabe Tudo?

É sabido o quanto os religiosos acreditam que D'us é Aquele que tudo pode fazer. Aquele que, por ser completo, não precisa de nada. Como falamos a cada ano nas tfilot de Rosh Hashaná e Yom Kipur, "Vekol maaminim shehu kol iachol" - "E todos acreditam que Ele pode tudo". Como disse David hamelech no tehilim (salmos), "Ele sabe de todos os pensamentos de todos homens". Agora, para quem passou pela parashá Bo, que lemos na ultima semana, ou pra quem lembra da história da Hagada de Pessach, surge uma pergunta óbvia. D'us pede que os iehudim coloquem no batente das suas casas um pouco do sangue do korban (sacrifício), para que Ele soubesse quais casas não castigar com a última praga, a dos primogênitos. Será que realmente D'us não sabia quais casas eram de egípcios ou não? De maneira semelhante, por que precisamos rezar três vezes por dia, pedindo tudo o que queremos, se antes de nascermos Ele já sabia tudo o que iria passar pela nossa mente?
Para fazer o korban (e não deve ser nada fácil matar um animal que é idolatrado no país onde se mora), os iehudim tiveram que se esforçar muito. Como consequência do esforço realizado, deram valor, e por isso se poderiam se sentir identificados, se sentir queridos, e com a sensação que Alguem está aí pra eles. Sem dúvidas, com isso se fortificam a identidade judaica e o contato com D'us. No caso das rezas, é a mesma coisa. Paramos ao acordar, ao meio do dia, e à noite para lembrar que temos um contato com D'us. Lembramos Suas vontades, nossas vontades, e do mesmo modo a identidade também se fortalece.
A resposta para as duas perguntas é a mesma. Com certeza, Ele sempre soube de tudo o que pode ter pensado em surgir na face da Terra, e Ele não precisa de nada. Justamente por isso, somos nós os únicos que têm algo a ganhar fazendo o que Ele manda. Cada mitzvá é uma chance de cada um de nós crescer e se aproximar Dele.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Vamos Nadal!!


Quem acordou mais cedo para ver a semi final do aberto da Austrália não se arrependeu. E quem acordou tarde também não, já que o jogo bateu o recorde de duração no Australian Open: 5h 14 min. O número 1 do mundo Rafael Nadal precisou de 5 sets (6-7, 6-4, 7-6, 6-7, 6-4) e da típica raça para vencer seu conterrâneo Fernando Verdasco, número 14 do ranking. Depois de tanta pancadaria pra um lado e pro outro, o jogo terminou numa dupla falta de Verdasco...

O duelo de canhotos espanhóis vai ser reprisado as 15h pela ESPN internacional. Ou seja, até começar o shabat há o que ver na tv. A final será domingo, entre Nadal e Roger Federer, às 6h30 da manhã, horário de Brasília.

Homens livres e shlichim

Aqui em Israel estamos no meio de uma guerra diplomática que foi aberta em várias frentes. Expulsamos o embaixador da Venezuela ontem (depois que o Huguito expulsou o embaixador israelense e vários shlichim da agência judaica de Caracas há algumas semanas). Fizemos com que o primeiro ministro turco abandonasse o fórum em Davos (depois de reafirmarmos o nosso direito a auto-defesa). E estamos pensando em alguma resposta para a decisão espanhola de processar oficiais do exército israelense por crimes de guerra (talvez seja essa a hora de pedir indenizações pelos judeus que os malditos avós dos espanhóis queimaram nas fogueiras da inquisição. Acho que isso configura um crime contra a humanidade, não?).
Enfim, espero que a vitória diplomática de Moshê no Egito (valendo-se de todos os meios de pressão disponíveis) na parashá dessa semana, possa nos iluminar.
Aliás, é nessa parashá que Moshê abre o segundo front de sua guerra: como tirar o Egito de dentro dos judeus. Como fazer com que 600 mil pessoas abandonem uma mentalidade de escravos?
A primeira medida (ou mitzvá, no vocabulário da psicologia do Tanach) foi o mandamento de santificar meses. No judaísmo os meses são lunares (numa antítese ao calendário egípcio pagão, baseado no sol), e quem declara o nascimento do mês é o tribunal central (que ficava ao lado do Beit HaMikdash) com base em testemunhas, que afirmavam terem visto a lua nova.
Ou seja: homens livres devem saber que eles tem o tempo em suas mãos. Somos nós que instituímos o nosso calendário (e consequentemente, as datas das festas, inclusive Pessach). Um escravo não precisa se preocupar com o relógio: o seu senhor se preocupa por ele. Mas nós somos homens livres, com todos os direitos e obrigações que isso implica.
A outra medida foi a instituição do Korban Pessach. Os judeus deveriam tomar um carneiro (que era idolatrado como deus pelos egípcios), amarrá-lo por 5 dias nos pés de suas camas, e sacrificá-lo e comê-lo no 5o dia. Que desparate aos egípcios! Onde já se viu? Matar e comer o deus alheio (ironia do destino: foi essa mesma acusação que a igreja católica carregou contra nós por 2000 anos). É verdade que devemos respeitar as idéias alheias, mas há um limite de quanto podemos tolerar – principalmente dentro de nossas casas.
Dentro de nossas casas nós somos soberanos, e não podemos aceitar qualquer influência cultural pagã. A ousadia é o contrário da submissão escrava.
Por fim. As leis do sacrifício de Pessach são a base do conceito de sociedade e “shlichut” (representação; procuração).
Duas famílias com poucos integrantes podiam dividir as despesas na compra de um único carneiro para ambas (a sociedade). E quando o representante da família sacrificava o carneiro, ele isentava toda a sua família da obrigação de sacrifício. Por mais que a Torá obrigou todos os judeus a sacrificarem carneiros, um único judeu podia representar e cumprir a obrigação de vários outros (que o nomeassem como “sheliach”). Nas palavras do Talmud: “Shlicho shel adam kemoto”. “O procurador de uma pessoa é como ela própria”.
Esses conceitos de sociedade e representação são a base do conceito de um povo e de uma nação. São a base de uma filosofia coletiva, onde existe um pacto social e uma obrigação mútua entre um grupo de pessoas. Parte do processo de virarmos indivíduos livres, é entendermos que fazemos parte de um povo, com o qual compartilhamos um passado e um futuro comum.
E é exatamente esse conceito que se esconde por trás de toda ofensa diplomática: quando o Chavez expulsa os enviados da Agência Judaica de Caracas, ele está enviando uma mensagem a todos os judeus do mundo, que são representado por eles. A mesma coisa com a decisão do juiz espanhol e os oficiais do exército de Israel. É exatamente por isso que a nossa resposta deve ser dura e exemplar. Por que nós somos homens livres.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Vida dupla X Vida ampla

Chame ele de sir, de rabino, ou de Ph.D: Jonathan Sacks. Dos seus vários livros, somente 3 foram traduzidos ao português, e um deles foi publicado pela Editora Sefer, em 2007: Para Curar um Mundo Fraturado. Coloco aqui um trecho em que ele transcreve a carta que um rav respondeu ao seu aluno, quando esse perguntou se fazer uma carreira acadêmica, fora do contexto religioso, seria levar uma vida dupla. O aluno temia abrir mão do sagrado estudo de Torá. Ai vai a resposta, que por si só dispensa comentários:

Quero dizer a você que, na minha opinião, as lutas internas sobre as quais você escreve têm sua fonte em uma compreensão equivocada do assunto. A impressão geral que se percebe de suas palavras é que você está agindo sobre o pressuposto de que procurar uma 'carreira secular' significa levar uma 'vida dupla'. Não preciso lhe dizer que eu nunca concordaria que você levasse uma vida dupla. Alguém que aluga um quarto para viver e ao mesmo tempo é hospede de um hotel certamente está levando uma vida dupla. Mas uma pessoa que aluga um apartamento com dois quartos não leva uma vida dupla, mas uma vida ampla.
Eu me lembro de uma visita que fiz a um hospital em Jerusalém, onde trabalhava um médico ortodoxo. Vi que se aproximou do paciente que estava prestes a operar. Perguntou a ele o nome da sua mãe, para que pudesse fazer uma prece pelo sucesso da cirurgia. Quando contei este episódio a um dos grandes Sábios da Torá em Jerusalém, ele exclamou: 'Que maravilha ser como um judeu assim, ter uma oportunidade tão grande de servir de veículo a gloria dos Céus!' Diga-me, querido amigo: um médico que está prestes a realizar uma cirurgia em um paciente e recita um salmo pedindo por sua recuperação plena está levando uma vida dupla?
Querido amigo, que D'us não permita que você veja a si mesmo como alguém que leva uma vida dupla. Nossos sábios dizem que 'Quem prolonga a palavra Um [echad, em hebraico, no Shemá], prolonga os seus dias e anos'. Assim, ao longo de sua vida, esteja entre aqueles que 'prolongam o Um' - focalizado na unidade, não na dualidade. Eu ficaria muito triste se isto não se tornasse claro para você. Uma série de pontos espalhados sem critério certamente constituem uma multiplicidade, mas o mesmo número de pontos ordenados ao redor de um único ponto central formam um círculo. Esta é a sua missão na vida - colocar o 'Um' no centro da sua vida. Então, você não precisará se preocupar com dualidades. Cada novo ponto que você acrescentar apenas aumentará o círculo. Mas sua unidade permanecerá"

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Cada um no seu nível

Ontem tive a oportunidade de assistir à final da Copa São Paulo de Futebol Júnior, entre o Atlético-PR e o Corinthians. Pela sétima vez, o timãozinho foi campeão do maior torneio de futebol sub-19 do país. Apesar do 2 a 1 alvinegro, e das 3 expulsões no segundo tempo, o que mais me chamou a atenção no Pacaembu ficou fora dos 90 minutos. Fiquei espantado em como a molecada - os jogadores - comemorou o título da Copinha, e acho que só quem estava lá consegue entender quanta alegria.
Para um jogador profissional, um campeonato digno dessa comemoração é, no mínimo, um Brasileiro, uma Libertadores. Mas pense que, para aqueles garotos, o máximo que eles podiam fazer era serem campeões da Copinha - e mereciam comemorar, afinal de contas, isso é o que sonhavam os 88 times no início.
Pode parecer que faltam assuntos dos quais aprender lições, mas não posso deixar de escrever algo que me vem à mente desde ontem. Como escrito no Pirkei Avot (Ética dos Pais), não há nada nesse mundo do qual não podemos tirar um lição. Então aqui vou eu.
Do mesmo jeito, alguém que está em certo nível no judaísmo, deve se esforçar ao máximo para cumprir o que está a seu alcance. Não se pode cobrar de alguém que nasceu no Brasil em uma família não-religiosa o mesmo que se cobraria de uma criança que nasceu em Mea Shearim ou Bait Vagan (bairros religiosos de Jerusalém). Do mesmo jeito que em títulos, sempre é possível ganhar mais: mais mitsvót, mais estudos, mais kavaná (concentração) nas brachot e tfilot. Da mesma maneira, cada degrau na 'escada que chega até os céus' deve ser comemorado, mas sempre sem se esquecer de que é possível crescer cada vez mais - e esse é o nosso objetivo a cada momento que nos é dado. No entanto, a vantagem em relação aos jogadores de qualquer esporte é que, quanto mais tempo no caminho e quanto mais velhos ficamos, são o conhecimento, a experiência e a satisfação que se somam, ao invés das lesões e da falta de preparo físico.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Já está mais do que na hora de mudar

Na sinagoga, vemos essa semana que Moshe começa a luta para que os judeus saiam do Egito (valendo-se de meios diplomáticos e armas não convencionais). No jornal, os nossos soldados saíram de Gaza. Assim como o Faraó dava sinais de apaziguamento durante as pragas (e prometia libertar o povo judeu) mas depois voltava atrás, os palestinos também esquecem de quaisquer promessas e já aproveitam o atual período de trégua para se rearmarem. Infelizmente nós ainda não aprendemos a lição da História.

Aliás, os nossos sábios explicam que mais difícil que tirar o povo judeu do Egito, foi tirar o Egito de dentro do povo judeu. Em outras palavras: é difícil mudar a mentalidade de um povo que se acostumou a viver como escravo. Essa mentalidade explica o medo que o nosso povo teve de vir para Israel quando pecou com os espiões. O mesmo fenômeno ocorre hoje em dia. Temos o nosso país independente, mas ainda temos uma mentalidade dependente (como se diz em hebraico: "uma cabeça de exílio"). Desde que nossos soldados entraram em Gaza, Israel sofre muita pressão dos dirigentes, porém não respondemos a altura.

Por que quando a Rússia diz que "está preocupada com a situação humanitária em Gaza", não respondemos que "estamos preocupados com a situação humanitária na Chechênia"? Desde que começou a guerra, mandamos quase que semanalmente representantes ao Egito, que se enxerga como "o diplomata do Oriente Médio", para tratar sobre a "crise humanitária" e sobre o futuro controle na fronteira entre Gaza e o Egito. Por que o Egito não se deu ao trabalho de mandar uma única vez um representante a Tel Aviv? Aliás, por que nós não exigimos isso deles?

Há um consenso de que sempre que há uma negociação somos nós que devemos nos humilhar. Que o mundo pense assim é natural. Que nós concordemos com isso é assustador. Assim que saímos do Egito, D'us nos proibiu de voltar para lá (e esse é um dos 613 mandamentos). A partir da hora em que nos outorgaram a soberania, estamos proibidos de voltar a pensar como escravos. Nossos soldados deram a vida em Gaza para devolver a honra ao nosso Estado, e é imperdoável que nossos líderes joguem ela pela janela a troco de nada.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Tá se escondendo do que?

Pare para pensar em quem foi Moshe. Aquele que cresceu no palácio do Faraó e manteve sua personalidade judaica. Aquele que foi a pessoa mais humilde a existir na face da Terra. Foi Moshe quem mostrou ao Faraó quem manda no mundo, foi Moshe quem D'us escolheu para abrir o mar. Ele conduziu o difícil e teimoso Am Israel no deserto durante 40 anos (eu não aguentaria nem um ano em qualquer cidade desenvolvida...). Por fim, mais do que tudo, foi ele quem ouviu e aprendeu toda a Torá (tanto a escrita como a oral) da 'boca' de D'us. Cada um desses motivos já seria suficiente por si só para mostrar sua grandeza. Imagine dois deles juntos, agora três, e agora todos eles juntos. Agora eu te pergunto: como é que uma pessoa dessa grandeza moral/espiritual foi proibida por D'us de entrar na prometida e esperada eretz Israel?!
Uma das respostas está na parashá que lemos na semana passada (eu sei que já postamos algo aqui, mas nunca é tarde, nem demais...). Moshe fugiu do Egito, foi para Midian, e lá ajudou as filhas de Itró. Elas o chamam para comer em casa, e quando o pai pergunta quem as ajudou, elas dizem que foi um tal egípcio. Na frase seguinte, lemos que Moshe já estava contente ao se sentar com Itró.
Para qualquer um de nós, não parece nada de grave. Mas para alguém do nível de Moshe, não fazer questão de corrigir as meninas e dizer "ei, egípcio não! Judeu!" foi um tremendo de um erro - e talvez por isso foi castigado e proibido de entrar em eretz Israel. É claro que tudo tem sua hora e não devemos falar qualquer coisa em qualquer momento. Mas em alguns casos do cotidiano não devemos ter medo nem vergonha de assumir a identidade do povo a que pertencemos.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Obama na Casa Branca

Muitos estão com medo de como o novo presidente americano vai atuar em relação ao Oriente Médio, e mais precisamente, em relação a Israel. Alguns fatos me tranquilizam: (1) Barack Hussein Obama, descendente de muçulmanos, se converteu ao cristianismo; (2) o lobby que a comunidade possui na política americana continua forte; (3) Obama não  governa sozinho, depende de seus acessores e do senado, e (4) acima de tudo, o mundo sempre  vai ser governado por D'us e tudo o que ocorrer durante o mandato será o que Ele quiser.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Australian Open

Começou hoje um dos quatro grand slams, o aberto da Austrália. Hoje, que na verdade já foi ontem na terra dos cangurus. Com a diferença de 13 horas devido ao fuso, fica mais fácil assistir aos jogos da manhã (que passam lá pelas dez da noite) do que aos da noite (que passam às 6:30 da manhã). Entre os favoritos, estão o atual campeão Novak Djokovic, Andy Murray, o número 1 Rafael Nadal, Roger Federer, e o francês finalista de 2008 Jo-Wilfried Tsonga.
Os jogos estão sendo transmitidos pela ESPN internacional.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Sim. É possível

Em tempos de guerra, vem à tona o conceito de Kidush HaShem. De acordo com o judaísmo há várias situações nas quais um judeu (ou um grupo de judeus) tem a oportunidade de fazer alguma ação que venha a "santificar o nome de D-us".
Essa idéia pode se manifestar de várias maneiras, e acho que nessa guerra uma delas ficou muito claro. É possível vencer terroristas que utilizam táticas de guerrilha! É possível vencer batalhas em terreno urbano! É possível lutar contra os jihadistas desse mundo!
O relativo fracasso dos EUA no Afeganistão e no Iraque, deram a impressão de que o mundo estava frente a uma nova ameaça que era impossível de ser vencida: a guerra (muitas vezes não declarada) contra terroristas, que embora fossem mais fracos do ponto de vista militar, tinham vantagens das táticas de guerrilha.
Os muçulmanos fanáticos de todo o mundo (e especialmente ao redor de Israel, vulgo "inimigo sionista") levantaram essa bandeira. Através de atentados seria possível dobrar os ocidentais infiéis, e as derrotas no Iraque (em 2005), Afeganistão (2001) e (de acordo com eles) no Líbano (em 2006), seriam provas de que eles haveriam encontrado a forma de subjugar todo o mundo ao Corão.
Porém nas últimas semanas Israel provou o contrário. É verdade: perdemos soldados (em Gaza) e civis (vítimas de mísseis), mas estamos conseguindo levar a cabo uma guerra contra o Hamas em seu próprio território. O que muitos acreditavam que seria o Vietnã israelense (dada a quantidade de túneis construídos pelos palestinos) se revelou uma vitória incontestável de Israel.
Se os méritos são exclusivos do nosso exército, e de sua disciplina? Felizmente não. É inegável a raça e a determinação dos nossos irmãos que lutam pelas vielas de Gaza (e dos heróis civis que vivem na retaguarda), mas a cada dia que passa ficam mais claros os milagres que ocorrem para as nossas tropas todos os dias a todo tempo. Bombas descobertas e neutralizadas no último instante. Minas que não explodiram. Tentativas de sequestro de soldados frustradas. A lista não termina.
Sem dúvida a guerra contra terroristas é dura e difícil, mas Israel está provando a todo o mundo, que com bastante disciplina e com a ajuda de D-us é possível vencer os chantagistas da Jihad (mesmo quando eles usam escolas, hospitais, ecudos humanos e mísseis com fósforo).

Ioiô

Pode parecer o maior dos clichês, mas é pura verdade. Chame ele de 'o mundo da voltas', 'tudo que vai volta', ou como preferir.Na parashá dessa semana, shemot, temos o nascimento daquele que um dia traria a Torá para esse mundo. De acordo com o decreto do Faraó, todos meninos recém nascidos deveriam ser jogados no Nilo. O poderoso e influente rei do Egito nunca imaginaria, no entanto, que o alvo de seu decreto seria um dia o líder do povo que afundaria também na água, seu até então super exército.Segundo a Torá, o mundo é regido de acordo com esse conceito: midá kenegued midá (ou medida por medida). E isso vale pra tudo. Quem sorri recebe outro sorriso, quem ensina também aprende, fulano é bom com as pessoas à sua volta e assim são com ele também. Pode demorar, as pessoas podem não perceber no momento, mas quem segue os caminhos certos sempre é recompensado. Alguém sabe cadê a descendência do Faraó e de todo seu império?

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Rav e Ph.D.

Recentemente li um livro do Rav e Ph.D. Norman Lamm, presidente da Yeshiva University durante quase 30 anos. Em 'Torá uMadá: Judaísmo e Conhecimento Secular' (ed. Sefer, 2006), o autor expõe e defende diversas maneiras de conciliar o estudo da cultura judaica aos estudos acadêmicos. São discutidos vários argumentos usados por aqueles que seguem a tendência de 'somente Torá', e os mesmos são rebatidos por Lamm, demonstrando sua visão de mundo mais aberta.
Coloco aqui um texto que ele usa para ilustrar os perigos de se fechar em seu próprio mundo e fingir que outras culturas (novas, mais abertas ou modernas) e problemas não existem, indicando que tal comportamento é um sinal de vulnerabilidade e medo, ao invés de segurança.
"O Pesadelo
Estou viajando em um automóvel confortável enquanto o clima lá fora é decididamente inclemente - as luzes ficam distorcidas e confusas na medida em que se refletem no asfalto molhado e o trânsito está pesado em ambas direções. As janelas estão bem fechadasm deixando para fora o ruído nervoso de buzinas barulhentas, freios guinchando e engrenagens rangendo. O sistema de ar-condicionado do automóvel cria um ambiente artificial de rara paz e conforto enquanto o rádio toca minha música favorita em som estéreo, e o metrônomo incessante dos limpadores de pára-brisa ditam o seu próprio ritmo obtuso. Por um momento - mais que um momento - eu permaneço distraído do mundo tumultuado que existe fora do carro. As luzes ofuscantes, a desordem e os ruídos irritantes evaporam da minha consciência enquanto desfruto da relativa tranquilidade dentro do meu carro. Meu olhar fixo desvia-se do pára-brisa e se volta gentilmente para as luzes delicadas que cintilam desde os seus seguros números digitais do painel autmoatizado como se fossem algumas estrelas. Sorrio por dentro, na medida em que a minha auto-hipnose repele com sucesso o pandemônio e os pergios do mundo lá fora, o caos perturbador do avanço pela rodovia ou o cruzamento urbano com os rugidos da estrada diante de mim. Imagino o interior do automóvel como um Mundo em si mesmo, meu próprio universo autocontido, seguindo suas próprias regras e buscando o seu próprio destino, seguindo em qualquer direção que desejar, um reino autônomo. Uma sensação de euforia faz com que as minhas pálpebras se fechem. De repente, o estrondo de um batida..."

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Parashá stuma

Amanhã é dia de falar chazak chazak venitchazek: terminamos a leitura de Bereshit desse ano. Aportuguesando, 'muito bem'. A última parashá do primeiro chumash é vaiechi, onde são contados os últimos momentos de Itschak. Todas as parashiot são separadas entre si por espaços de 9 letras, ou começam na linha seguinte. No entanto, essa é a única entre todas as 54 que não é separada - é uma parashá stumá, em hebraico, fechada.

Nossos sábios z"l explicam que o motivo é simples: com a morte de Yaakov, os olhos e corações dos seus filhos se fecharam. Eles não deram importância para as últimas palavras da parashá anterior, que diziam que os filhos de Yaakov (ou Israel) - literalmente, bnei Israel - já tinham muitas terras no Egito. Não somente tinham parte na terra do Egito, física, como também já estavam por dentro da cultura local, espiritual. Em outras palavras, estavam começando a se assimilar e esquecer dos princípios e ideais que aprenderam com o pai. Se estivessem com os olhos mais abertos, iriam ver que a escravidão não era algo tão distante - foi somente uma consequência.

Se eles fecharam os olhos para uma coisa que estava por vir, e se deram mal, a gente tem que aprender a ficar esperto também. O que falar então das situações em que as coisas estão claras, em baixo do nariz, e a gente nem percebe que a solução está bem ali? Basta abrir os olhos e encontrar a resposta.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Apple sem grandes novidades

Esta semana está ocorrendo a MacWorld Expo 2009, uma conferência que envolve produtores e clientes de produtos da Apple (ou Mac maníacos). Como de costume, a Apple fez sua apresentação, o keynote, mas dessa vez não foi Steve Jobs quem apresentou as novidades.
Muitos esperavam por notícias no iPhone - alguns acreditavam em expansão da memória para 32 GB (ou 64 GB no iPod Touch), enquanto outros em um possível lançamento de um iPhone Nano. Nenhuma das 3 novidades foi o que muitos esperavam: novos softwares iLife e iWork, um novo MacBook Pro, e mudanças na loja virtual de músicas do iTunes... Enquanto isso, esperamos pela próxima keynote.

Mudar as palavras

Coloco aqui um texto escrito por João Pereira Coutinho (jpcoutinho@folha.com.br), colunista da Folha. Seria bom se todos os brasileiros lessem, e quem sabe, muitos não seriam levados pela onda da mídia. É longo, mas vale a pena.
Mudar as palavras
ISRAEL ESTÁ novamente em guerra com os terroristas do Hamas, e não existe comediante na face da Terra que não tenha opinião a respeito. Engraçado. Faz lembrar a última vez que estive em Israel e ouvi, quase sem acreditar, um colega meu, acadêmico, que em pleno Ministério da Defesa, em Jerusalém, começou a "ensinar" os analistas do sítio sobre a melhor forma de acabarem com o conflito. Israel luta há 60 anos por reconhecimento e paz.
Mas ele, professor em Coimbra, acreditava que tinha a chave do problema. Recordo a cara dos israelenses quando ele começou o seu delírio. Uma mistura de incredulidade e compaixão.
Não vou gastar o meu latim a tentar convencer os leitores desta Folha sobre quem tem, ou não tem, razão na guerra em curso. Prefiro contar uma história.
Imaginem os leitores que, em 1967, o Brasil era atacado por três potências da América Latina. As potências desejavam destruir o país e aniquilar cada um dos brasileiros. O Brasil venceria essa guerra e, por motivos de segurança, ocupava, digamos, o Uruguai, um dos agressores derrotados.
Os anos passavam. A situação no ocupado Uruguai era intolerável: a presença brasileira no país recebia a condenação da esmagadora maioria do mundo e, além disso, a ocupação brasileira fizera despertar um grupo terrorista uruguaio que atacava indiscriminadamente civis brasileiros no Rio de Janeiro ou em São Paulo.
Perante esse cenário, o Brasil chegaria à conclusão de que só existiria verdadeira paz quando os uruguaios tivessem o seu Estado, o que implicava a retirada das tropas e dos colonos brasileiros da região. Dito e feito: em 2005, o Brasil se retira do Uruguai convencido de que essa concessão é o primeiro passo para a existência de dois Estados soberanos: o Brasil e o Uruguai.
Acontece que os uruguaios não pensam da mesma forma e, chamados às urnas, eles resolvem eleger um grupo terrorista ainda mais radical do que o anterior. Um grupo terrorista que não tem como objetivo a existência de dois Estados, mas a existência de um único Estado pela eliminação total do Brasil e do seu povo.
É assim que, nos três anos seguintes à retirada, os terroristas uruguaios lançam mais de 6.000 foguetes contra o Sul do Brasil, atingindo as povoações fronteiriças e matando indiscriminadamente civis brasileiros. A morte dos brasileiros não provoca nenhuma comoção internacional.
Subitamente, surge um período de trégua, mediado por um país da América Latina interessado em promover a paz e regressar ao paradigma dos "dois Estados". O Brasil respeita a trégua de seis meses; mas o grupo terrorista uruguaio decide quebrá-la, lançando 300 mísseis, matando civis brasileiros e aterrorizando as populações do Sul.
Pergunta: o que faz o presidente do Brasil?
Esqueçam o presidente real, que pelos vistos jamais defenderia o seu povo da agressão.
Na minha história imaginária, o presidente brasileiro entenderia que era seu dever proteger os brasileiros e começaria a bombardear as posições dos terroristas uruguaios. Os bombardeios, ao contrário dos foguetes lançados pelos terroristas, não se fazem contra alvos civis -mas contra alvos terroristas. Infelizmente, os terroristas têm por hábito usar as populações civis do Uruguai como escudos humanos, o que provoca baixas civis.
Perante a resposta do Brasil, o mundo inteiro, com a exceção dos Estados Unidos, condena veementemente o Brasil e exige o fim dos ataques ao Uruguai.
Sem sucesso. O Brasil, apostado em neutralizar a estrutura terrorista uruguaia, não atende aos apelos da comunidade internacional por entender que é a sua sobrevivência que está em causa. E invade o Uruguai de forma a terminar, de um vez por todas, com a agressão de que é vítima desde que retirou voluntariamente da região em 2005.
Além disso, o Brasil também sabe que os terroristas uruguaios não estão sós; eles são treinados e financiados por uma grande potência da América Latina (a Argentina, por exemplo). A Argentina, liderada por um genocida, deseja ter capacidade nuclear para "riscar o Brasil do mapa".
Fim da história? Quase, leitores, quase. Agora, por favor, mudem os nomes. Onde está "Brasil", leiam "Israel". Onde está "Uruguai", leiam "Gaza". Onde está "Argentina", leiam "Irã". Onde está "América Latina", leiam "Oriente Médio". E tirem as suas conclusões. A ignorância tem cura. A estupidez é que não.